Guia rápido: com quantos anos num imóvel posso pedir usucapião?

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Resposta curta: quinze anos para levar o imóvel por usucapião em quase qualquer hipótese, dez anos se entrou com justo título e boa fé; cinco anos em condições muito restritas, dois anos sob condições mais restritas ainda. Leia o artigo para entender melhor!

Guia rápido: com quantos anos num imóvel posso pedir usucapião? Descrição: mulher negra brasileira, por volta de 40 anos de idade, segura um documento em frente à sua casa enquanto sorri.

No Brasil, segundo reportagem da Folha de S. Paulo de 13 de julho de 2023 , existem mais de 40 milhões de domicílios urbanos sem escritura, e 60% dos imóveis brasileiros apresentam algum tipo de irregularidade documental.

A falta de documentação adequada gera riscos que vão desde a necessidade de investir na regularização da documentação do imóvel depois da compra , que pode não ter sido prevista no momento da compra, até a perda do imóvel, por causa de processos contra a pessoa cujo nome está na matrícula do imóvel como proprietário (o chamado proprietário tabular).

Um dos primeiros pensamentos a passar pela mente de quem percebe os problemas da falta de regularização do próprio imóvel é: usucapião.

Usucapião é uma forma de conseguir a propriedade de um bem (imóvel ou móvel, tanto faz) por ter exercido posse sobre ele durante um período previsto em lei.

(Móvel? Sim, existe usucapião de coisas móveis, como carros, roupas, jóias, livros, etc. Como escrevemos um artigo bem completo sobre o assunto , recomendamos a leitura para quem se interessou, e vamos seguir tratando só de imóveis.)

Entretanto, não são poucas as dúvidas quanto ao assunto.

Neste artigo, apresentaremos rapidamente os prazos necessários para conseguir a propriedade de um imóvel por usucapião.

Em outros artigos, trataremos com muito mais detalhes o passo a passo de uma usucapião extrajudicial, e também 10 conceitos-chave para entender a usucapião.

Lendo e entendendo bem nossos artigos sobre a usucapião, é possível começar a analisar se existe direito à usucapião de um imóvel, além de começar a juntar os documentos necessários para pedir a usucapião.

Quinze anos: usucapião extraordinária

Diz o artigo 1.238 do Código Civil:

Art. 1.238. Aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como seu um imóvel, adquire-lhe a propriedade, independentemente de título e boa-fé; podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual servirá de título para o registro no Cartório de Registro de Imóveis.

Esta é a usucapião extraordinária, a forma “mais forte” de usucapião.

Por ser extraordinária (ou seja, “fora do ordinário”, “fora do comum”), ela é uma espécie de “limpa-tudo”, que elimina quase todos os problemas da posse.

A ideia por trás dela é muito simples: passar quinze anos na posse de um imóvel sem oposição nem interrupção é tempo suficiente para superar qualquer problema anterior.

Dez anos: usucapião ordinária

Diz o artigo 1.242 do Código Civil:

Art. 1.242. Adquire também a propriedade do imóvel aquele que, contínua e incontestadamente, com justo título e boa-fé, o possuir por dez anos.

Esta é a usucapião ordinária, a segunda forma “mais forte” de usucapião.

Nesta modalidade aparece uma exigência diferente: “justo título e boa fé”, explicadas com muito mais detalhes em nosso guia rápido com 10 conceitos-chave para entender a usucapião.

Basta saber, em resumo, que o justo título é algum documento ou fundamento jurídico que ampara a posse, conferindo legitimidade ao usucapiente; e que a boa-fé é o estado psicológico de quem acredita exercer posse sobre o imóvel de maneira legítima e sem impedimentos legais.

Cinco anos: usucapião especial

A Constituição de 1988 criou, e o Código Civil desenvolveu, duas formas especiais de usucapião, com prazo reduzido para cinco anos.

Usucapião especial urbana

Diz o artigo 183 da Constituição de 1988:

Art. 183. Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinqüenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.

§1º. O título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil.

§2º. Esse direito não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez.

*§3º. Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião.

Complementarmente, diz o artigo 1.240 do Código Civil:

Art. 1.240. Aquele que possuir, como sua, área urbana de até duzentos e cinqüenta metros quadrados, por cinco anos ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.

§1º. O título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil.

§2º. O direito previsto no parágrafo antecedente não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez.

Usucapião especial rural

Diz o artigo 191 da Constituição de 1988:

Art. 191. Aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural ou urbano, possua como seu, por cinco anos ininterruptos, sem oposição, área de terra, em zona rural, não superior a cinqüenta hectares, tornando-a produtiva por seu trabalho ou de sua família, tendo nela sua moradia, adquirir-lhe-á a propriedade.

Parágrafo único. Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião.

Complementarmente, diz o artigo 1.239 do Código Civil:

Art. 1.239. Aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural ou urbano, possua como sua, por cinco anos ininterruptos, sem oposição, área de terra em zona rural não superior a cinqüenta hectares, tornando-a produtiva por seu trabalho ou de sua família, tendo nela sua moradia, adquirir-lhe-á a propriedade.

Características comuns às duas usucapiões especiais

Como as duas modalidades de usucapião especial fazem parte de uma política mais ampla de regularização fundiária voltada para pessoas de menor poder aquisitivo, há mais exigências que nas formas ordinária e extraordinária de usucapião:

Portanto, além do prazo de cinco anos, há outras características que devem ficar muito bem provadas para conseguir a usucapião especial.

Dois anos: usucapião familiar, ou por abandono de lar

Diz o artigo 1.240-A do Código Civil:

Art. 1.240-A. Aquele que exercer, por 2 (dois) anos ininterruptamente e sem oposição, posse direta, com exclusividade, sobre imóvel urbano de até 250m² (duzentos e cinquenta metros quadrados) cuja propriedade divida com ex-cônjuge ou ex-companheiro que abandonou o lar, utilizando-o para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio integral, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.

§1º. O direito previsto no caput não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez.

Esta modalidade especialíssima é a usucapião familiar, ou usucapião por abandono de lar, criada em 2011.

Reconhecendo o fato de que o abandono de lar por um dos cônjuges/companheiros é uma espécie de “divórcio informal” que gerava (e continua gerando) problemas sérios para a regularização de imóveis, os legisladores criaram uma forma de usucapião com prazo ainda mais curto (dois anos), usando requisitos semelhantes aos da usucapião especial urbana.

Atenção: o tempo de quem veio antes soma com o tempo de quem veio depois

Diz o artigo 1.243 do Código Civil:

Art. 1.243. O possuidor pode, para o fim de contar o tempo exigido pelos artigos antecedentes, acrescentar à sua posse a dos seus antecessores, contanto que todas sejam contínuas, pacíficas e, nos casos do art. 1.242, com justo título e de boa-fé.

Com isso, somando o tempo dos antecessores, é possível assegurar a usucapião mesmo quando se tem pouco tempo na posse do imóvel: basta que existam documentos comprovando a transmissão do imóvel do antecessor para a pessoa interessada na usucapião para que os tempos sejam somados.

Alguns exemplos de documentos comprobatórios da transmissão:

Conclusão

Este guia rápido pretendeu somente apresentar os prazos de usucapião previstos em lei.

A análise pormenorizada da documentação do imóvel, e detalhes da contagem de prazo, podem ser desafiantes para alguém leigo em Direito.

O melhor a fazer para conhecer a situação do imóvel, e preparar a usucapião, é buscar o serviço de um advogado de sua confiança.