Quais doenças graves dão direito à isenção de Imposto de Renda para aposentados, pensionistas e reservistas?
16 Nov 2025 · Tempo de leitura: 19 minuto(s)
A discussão sobre a isenção do IRPF para pessoas com doenças graves costuma surgir em momentos sensíveis da vida. O diagnóstico de uma cardiopatia grave, um câncer ou outra condição séria modifica rotinas, impõe despesas e exige adaptações. Em meio a tudo isso, muitas pessoas desconhecem que a legislação brasileira prevê um tratamento tributário diferenciado nessas situações.
Para ilustrar a realidade prática desse tema, imaginemos a história de uma pessoa que, após décadas de trabalho, passou a conviver com limitações resultantes de uma condição cardíaca severa. Mesmo com laudos médicos detalhando o quadro, ela continuou pagando imposto de renda sobre sua aposentadoria e, em alguns anos, teve retenções superiores ao que suportava. Anos depois, descobriu que poderia ter requerido isenção — e até recuperar valores pagos indevidamente. A dúvida surgiu: “Será que ainda posso solicitar esse direito?”
Essa história representa a realidade de muitos contribuintes. Diante disso, este artigo busca explicar, de forma clara e completa, como funciona o direito à isenção, quais são os fundamentos legais e jurisprudenciais, e como o leitor pode verificar se seu caso, ou o de um familiar, se enquadra nos critérios estabelecidos.
Se preferir, antes mesmo de ler nosso artigo você poderá responder um questionário simples, que te ajudará a entender se você tem possibilidade de receber a isenção, e também o imposto já pago:
Se escolheu continuar antes de responder, vamos à leitura!
O que é a isenção de IRPF para pessoas com moléstias graves?
A isenção de Imposto de Renda prevista para pessoas com doenças graves é um benefício tributário estabelecido pelos arts. 6º, XIV e XXI da Lei 7.713/1988. A norma prevê que rendimentos provenientes de aposentadoria, reforma ou pensão recebidos por pessoas com determinadas doenças graves não sofrem tributação de IRPF.
Trata-se de um mecanismo de proteção social que reconhece que a pessoa, ao enfrentar uma condição grave, possui necessidades especiais, muitas vezes com aumento de gastos com saúde, medicamentos, terapias, exames recorrentes e acompanhamento médico contínuo.
Quais doenças garantem o direito à isenção?
A legislação traz uma lista fechada de 16 doenças consideradas graves para fins de isenção:
- moléstia profissional
- tuberculose ativa
- alienação mental
- esclerose múltipla
- neoplasia maligna
- cegueira
- hanseníase
- paralisia irreversível e incapacitante
- cardiopatia grave
- doença de Parkinson
- espondiloartrose anquilosante
- nefropatia grave
- hepatopatia grave
- estados avançados da doença de Paget (osteíte deformante)
- contaminação por radiação
- síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS)
Como a lista é fechada, nenhuma outra doença, por mais grave que seja, dá direito à isenção. Apesar disso, o legislador tomou o cuidado de não fechar demais a lista – o que deu margem a incluir outras condições não listadas.
Alguns exemplos
Um exemplo: é comum procurar na internet qual Código Internacional de Doença – CID dá direito à isenção, mas a lista não especifica nenhum CID. O mesmo CID pode ser entendido como justificativa para a isenção ou não, a depender da gravidade do quadro clínico diagnosticado. Hipertensão primária crônica (CID I.10), por exemplo, depende de avaliação da gravidade do quadro clínico, ou de associação com outras doenças cardíacas, para justificar a isenção.
Outro exemplo: o mal de Alzheimer não está na lista, portanto não justificaria a isenção. Entretanto, considerando a gravidade do quadro, a jurisprudência tem se consolidado para enquadrá-lo como “alienação mental”.
Mais um exemplo: até não muito tempo atrás se discutia se a cegueira monocular (ou seja, de um olho só) dava direito à isenção ou não; hoje, a jurisprudência entende que tanto a cegueira monocular quanto a binocular (ou seja, dos dois olhos) assegura o direito.
Ainda outro exemplo: até 2023 se discutia se a pessoa soropositiva tinha direito à isenção pela sua própria condição, mesmo assintomática, ou se precisava desenvolver a síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS). A Turma Nacional de Uniformização do Conselho da Justiça Federal (TNU/CJF) decidiu, em seu Tema 321 , que basta o diagnóstico de soropositividade para ter direito à isenção, sem necessidade de aguardar o aparecimento de sintomas da AIDS.
Os exemplos mostram que, apesar de a lista ser fechada em 16 doenças, ainda há margem muito pequena para interpretação dos casos de moléstia grave que justificam a isenção. Essa margem depende da semelhança com alguma das 16 doenças da lista, ou da forma de enquadrá-las. Se está em dúvida, nosso questionário de avaliação poderá ajudar:
A isenção vale só para novos descontos, é retroativa, ou é as duas coisas ao mesmo tempo?
Com base no §4º, I do Decreto 9.580/2018, a isenção:
- vale para o futuro, suspendendo a tributação sobre rendimentos isentos;
- vale para o passado, permitindo que o contribuinte recupere valores pagos indevidamente.
Quando recua para o passado, a isenção vai até a data do diagnóstico ou até o limite de cinco anos anteriores ao pedido, conforme a regra de prescrição do art. 168 do CTN. Dentro desses limites, é possível pedir a restituição dos valores pagos, com juros e correção monetária.
Dois exemplos
Renilson foi diagnosticado com hanseníase em agosto de 2017 e sua aposentadoria retroage até aquele mês, mas só teve a isenção concedida em fevereiro de 2025. Neste caso, além de não ter mais descontos de IRPF retido na fonte de sua aponsentadoria a partir daquele mês, tem direito a pedir restituição dos descontos já feitos, recuando até fevereiro de 2020. Todo o período entre agosto de 2017 e fevereiro de 2020 é considerado perdido, por prescrição.
Nancy foi diagnosticada com câncer de mama (neoplasia maligna) em julho de 2024, correu para obter sua isenção de IRPF e conseguiu-a em agosto de 2025. Neste caso, além de fazer parar os descontos dessa data em diante, deve recuperar os valores descontados desde o mês do diagnóstico (julho de 2024) até a data da concessão da isenção (agosto de 2025). O período é curto, menor que cinco anos, então é possível resgatar todos os descontos realizados sem perdas.
A isenção beneficia qualquer renda de aposentado, pensionista ou militar reformado com doença grave?
A pergunta é comum entre aposentados, pensionistas ou militares reformados que têm outras fontes de renda.
A resposta é simples: não. Novamente, em letras garrafais e negrito: NÃO.
A isenção de IRPF não se aplica automaticamente a toda e qualquer renda, nem a quem está na ativa. Ela incide apenas sobre rendimentos de aposentadoria, reforma (no caso de militares) e pensões. Dividendos, juros de aplicações financeiras (exceto poupança), ganhos com ações, royalties de direitos autorais, aluguel de imóveis – enfim, todas as fontes não-isentas de renda continuam tributadas normalmente, e deve-se pagar o imposto devido.
Um exemplo: uma aposentada com cegueira monocular que recebe a aposentadoria e o aluguel da casa construída em cima daquela onde ela mora. Ela só terá isenção sobre a aposentadoria. Se a renda com alugueis entrar em alguma das faixas de renda que justificam cobrança de imposto de renda, ela continuará obrigada a pagar.
Outro exemplo: um pequeno empresário, sócio de seus dois filhos numa padaria de bairro, foi recentemente diagnosticado com doença de Parkinson e aposentou-se, transferindo a gestão da sociedade para um de seus filhos. Continua recebendo dividendos normalmente. Neste caso, a isenção de IRPF afeta somente sua aposentadoria; seus dividendos não são isentos. Se forem suficientes para obrigá-lo a pagar imposto de renda, ele deve pagá-lo.
O assunto será explicado com cuidado ao longo do artigo.
Quais documentos são úteis para conseguir a isenção?
Pela via administrativa, como se verá mais à frente, somente um laudo médico oficial, emitido por perito do INSS, fundamentará a isenção.
Pelo Judiciário, embora não se exija laudo oficial, além dos documentos pessoais e da carta de concessão de benefício do INSS a pessoa que deseja solicitar a isenção deve reunir:
- relatórios e laudos médicos;
- exames, prontuários e pareceres;
- documentos que indiquem o diagnóstico e sua evolução;
- comprovantes de recebimento de aposentadoria, reforma ou pensão (carta de concessão, CNIS, HISCRE, contracheques, etc.).
Cada situação deve ser analisada individualmente, mas a orientação geral é reunir toda a documentação médica e previdenciária disponível.
Quem pode pedir a isenção?
O benefício pode ser solicitado por:
- aposentados do regime próprio ou do INSS;
- pensionistas;
- beneficiários de reforma (militares).
É obrigatório estar aposentado, ser pensionista ou militar reformado para receber a isenção?
Sim, é obrigatório estar aposentado. A isenção prevista na lei se aplica apenas a rendimentos de aposentadoria, reforma ou pensão. Pela legislação atual, quem está na ativa não tem direito à isenção.
Se foi diagnosticado com alguma das doenças graves listadas no art. 6º, XIV da Lei 7.713/1988,, mas ainda não é aposentado, pensionista ou reformado, nem adianta tentar. Melhor buscar a aposentadoria, pensão ou reforma primeiro, se tiver direito a elas.
Contudo, para reconhecer o momento correto da retroação, é essencial entender o histórico clínico. Mesmo que a doença tenha surgido antes da aposentadoria, o direito à isenção nasce quando ocorre o enquadramento normativo — isto é, quando o contribuinte recebe rendimentos elegíveis (pensão, reforma ou aposentadoria).
Herdeiro de aposentado, pensionista ou militar reformado com diagnóstico de doença grave tem direito à isenção?
Depende.
O direito à isenção de IRPF é personalíssimo, ou seja, não se transmite aos herdeiros. Por isso, a isenção concedida a pai, mãe, avô, avó ou outro parente não passa para os herdeiros.
Se algum desses herdeiros também for aposentado, pensionista ou militar reformado e também for diagnosticado com doença grave, seu direito à isenção não veio por herança, mas porque sua condição de saúde o justifica.
Se estiver na ativa, ou se não tiver sido diagnosticado com doença grave, não tem direito à isenção.
Única situação autorizada: recuperar descontos sobre aposentadoria, pensão ou reforma de pessoa com moléstia grave já falecida
Por outro lado, há uma – e só uma – situação em que os herdeiros podem, sim, reivindicar na Justiça – e só na Justiça – a restituição dos valores descontados dos rendimentos previdenciários da pessoa falecida: quando essa pessoa tinha o diagnóstico da doença grave, era aposentada, pensionista ou reformada, mas não pediu a isenção em vida.
Isso é possível porque não está sendo buscada a isenção para os herdeiros, mas sim o direito dos herdeiros de receber o que era devido à pessoa falecida.
As provas nesse caso devem ser muito robustas, bem mais robustas do que quando a pessoa era viva – afinal, não será possível fazer perícia médica com a pessoa falecida.
Laudos médicos, prontuários de atendimento, exames, contracheques, HISCRE, CNIS, carta de concessão de benefício, todas as provas já mencionadas devem ser obtidas e revisadas com bastante cuidado por um advogado antes de se tentar a recuperação dos valores descontados.
Além disso, se a pessoa faleceu há mais de cinco anos, tudo o que teria sido possível recuperar já estará perdido pela prescrição.
O caminho mais provável dessa recuperação é um inventário, onde os herdeiros nomeiam um inventariante e o orientam expressamente a recuperar na Justiça os descontos indevidos sobre a aposentadoria, pensão ou reforma da pessoa falecida, para que sejam partilhados ou adjudicados.
Direito à restituição de valores pagos indevidamente
Se a isenção for concedida, o contribuinte beneficiado deixa de sofrer descontos de IRPF retido na fonte em sua aposentadoria ou pensão.
E o que já foi descontado, como fica?
O art. 165, I do Código Tributário Nacional (CTN) estabelece o direito de receber restituição de tributo cobrado indevidamente.
Esse direito se extingue em 5 (cinco) anos, conforme art. 168 do CTN.
Como reivindicar a isenção e a restituição dos valores pagos indevidamente
Há dois caminhos para reivindicar tanto a isenção quanto a restituição dos valores pagos indevidamente:
- a via administrativa, com um pedido feito diretamente ao governo federal para que reconheça o direito à isenção e pare de descontar IRPF de aposentadoria, pensão ou reforma.
- a via judicial, com contratação de advogado ou auxílio da defensoria pública para pedir na Justiça a isenção e a restituição.
As duas serão explicadas detalhadamente a seguir. Se está em dúvida quanto à melhor via (administrativa ou judicial), você pode responder nosso questionário.
A via administrativa: Receita Federal e perícia do INSS
Se um contribuinte portador de moléstia grave tem laudo, atestado ou relatório médico comprovando sua condição, pode tentar pedir a isenção diretamente à Receita Federal. É o que chamaremos de via administrativa .
A grande vantagem da via administrativa é sua rapidez: como os prazos administrativos são mais curtos, é possível obter a isenção em poucos meses. O risco está em que os peritos do INSS são muito rigorosos, e costumam dar laudos contrários à isenção quando, mesmo diagnosticada, a pessoa não mostra sintomas da doença grave.
O pedido é feito pela internet, por meio do sistema Meu INSS . É necessário acessar sua conta GOV.Br (nível Bronze ou superior), fazer login no Meu INSS, buscar por “isenção” entre os requerimentos, e selecionar o serviço “Solicitar Isenção do Imposto de Renda” para iniciar o processo.
No momento do requerimento, é preciso anexar documentos médicos que comprovem a doença grave — pode ser um laudo, atestado ou relatório médico.
Se o INSS considerar necessário, poderá convocar o segurado para uma perícia médica; a data, local e hora serão agendados pelo sistema.
Após a concessão, o INSS deixa de reter IR sobre os rendimentos elegíveis (aposentadoria, pensão ou reforma) a partir do momento da isenção.
Alguns casos são indeferidos por questões formais — por exemplo, quando a administração exige laudo médico oficial, o que contraria a orientação dos tribunais. Nesses casos, pode haver necessidade de revisão administrativa ou judicial.
A via judicial: processo na Justiça
A via judicial costuma ser buscada quando:
- o pedido administrativo é negado;
- há demora excessiva na análise;
- há desconto de IRPF indevido mesmo após pedido de isenção;
- a Receita Federal recusa retroagir o benefício à data do diagnóstico;
- a Receita Federal recusa devolver os valores já pagos entre a data do diagnóstico e a data da isenção.
Os tribunais têm reconhecido com frequência o direito à isenção e à restituição, especialmente com base nas súmulas do STJ e nos dispositivos legais citados a seguir.
Entretanto, deve-se ter em mente que os pedidos no Judiciário costumam ser mais demorados que os pedidos administrativos. Se há alguma urgência envolvida, especialmente quando já existe laudo médico particular com o diagnóstico da doença e os sintomas continuam ativos, talvez a via administrativa seja a melhor opção.
Base legal da isenção: o que a lei realmente diz
A regra central está na Lei nº 7.713/1988, que lista as doenças graves que geram direito à isenção quando o contribuinte recebe aposentadoria, reforma ou pensão:
Art. 6º. Ficam isentos do imposto de renda os seguinte rendimentos percebidos por pessoas físicas:
[…] XIV –* os proventos de aposentadoria ou reforma motivada por acidente em serviço e os percebidos pelos portadores de moléstia profissional, tuberculose ativa, alienação mental, esclerose múltipla, neoplasia maligna, cegueira, hanseníase, paralisia irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, doença de Parkinson, espondiloartrose anquilosante, nefropatia grave, hepatopatia grave, estados avançados da doença de Paget (osteíte deformante), contaminação por radiação, síndrome da imunodeficiência adquirida, com base em conclusão da medicina especializada, mesmo que a doença tenha sido contraída depois da aposentadoria ou reforma;
[…] XXI – os valores recebidos a título de pensão quando o beneficiário desse rendimento for portador das doenças relacionadas no inciso XIV deste artigo, exceto as decorrentes de moléstia profissional, com base em conclusão da medicina especializada, mesmo que a doença tenha sido contraída após a concessão da pensão.
A regulamentação está detalhada no Decreto 9.580/2018 (Regulamento do Imposto de Renda), especialmente:
Art. 35. São isentos ou não tributáveis:
[…] II – os seguintes rendimentos pagos pelas previdências públicas e privadas:
b) os proventos de aposentadoria ou reforma motivadas por acidente em serviço e aqueles percebidos pelos portadores de moléstia profissional, tuberculose ativa, alienação mental, esclerose múltipla, neoplasia maligna, cegueira, hanseníase, paralisia irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, doença de Parkinson , espondiloartrose anquilosante, nefropatia grave, hepatopatia grave, estados avançados de doença de Paget (osteíte deformante), contaminação por radiação, síndrome de imunodeficiência adquirida e fibrose cística (mucoviscidose), com base em conclusão da medicina especializada, mesmo que a doença tenha sido contraída depois da aposentadoria ou da reforma;
c) os valores recebidos a título de pensão, quando o beneficiário desse rendimento for portador de doença relacionada na alínea “b”, exceto aquela decorrente de moléstia profissional, com base em conclusão da medicina especializada, mesmo que a doença tenha sido contraída após a concessão da pensão;
§4º. As isenções a que se referem as alíneas “b” e “c” do inciso II do caput aplicam-se:
I – aos rendimentos recebidos a partir:
a) do mês da concessão da aposentadoria, da reforma ou da pensão, quando a doença for preexistente;
b) do mês da emissão do laudo pericial, emitido por serviço médico oficial da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios, que reconhecer a moléstia, se esta for contraída após a concessão da aposentadoria, da reforma ou da pensão; ou
c) da data em que a doença foi contraída, quando identificada no laudo pericial;
O decreto esclarece que a doença deve ser comprovada por laudo médico oficial, mas também reconhece que, comprovado o diagnóstico, a isenção pode retroagir à data do início da doença — entendimento hoje pacificado na jurisprudência, como veremos adiante.
O decreto também não diferencia entre previdência pública e privada. Com isso, ficou aberta a possibilidade de portadores de moléstias graves que recebem rendimentos de planos de previdência privada – p. ex., PGBL, VGBL e FAPI – também serem beneficiados pela isenção de IRPF sobre esses rendimentos.
A jurisprudência dos Tribunais Superiores: como o STJ e o STF consolidaram o direito
A interpretação dos tribunais superiores simplificou e ampliou de forma protetiva a aplicação da isenção, evitando exigências burocráticas que antes restringiam indevidamente o direito.
Súmula 598 do STJ
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) fixou a Súmula STJ 598 , que diz:
É desnecessária a apresentação de laudo médico oficial para o reconhecimento judicial da isenção do imposto de renda, desde que o magistrado entenda suficientemente demonstrada a doença grave por outros meios de prova.
Isso significa que o Poder Judiciário não pode exigir exclusivamente laudo emitido por serviço médico oficial, aceitando documentos médicos particulares, relatórios, exames e prontuários como prova da condição grave.
Por outro lado, se os juízes não estão “presos” aos laudos, a Receita Federal continua a exigi-los em pedidos administrativos de isenção , por força do art. 30 da Lei 9.250/1995.
Deste modo, se você já tentou conseguir a isenção pela via administrativa sem sucesso, poderá tentar pela via judicial.
Súmula 627 do STJ
A Súmula STJ 627 diz:
O contribuinte faz jus à concessão ou à manutenção da isenção do imposto de renda, não se lhe exigindo a demonstração da contemporaneidade dos sintomas da doença nem da recidiva da enfermidade.
Ou seja: mesmo que a pessoa tenha melhorado da doença, se ela houver sido comprovada a isenção ainda é devida.
Esse ponto é crucial, porque muitos só descobrem o direito após anos pagando imposto indevido — e podem, conforme explicaremos adiante, pedir restituição dos valores.
Tema 1.373 do STF (repercussão geral)
O Supremo Tribunal Federal (STF) fixou a seguinte tese no julgamento do Tema 1.373
O ajuizamento de ação para o reconhecimento de isenção de imposto de renda por doença grave e para a repetição do indébito tributário não exige prévio requerimento administrativo.
Essa tese permite que, se o contribuinte preferir, o pedido de isenção pode ser feito diretamente ao Poder Judiciário, sem necessidade de fazê-lo antes pela via administrativa .
Por que o governo federal dificilmente contesta esses casos na Justiça?
A Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) – para leigo entender: os advogados do Ministério da Fazenda, órgão do governo federal ao qual se subordina a Receita Federal – costumava contestar todas as ações judiciais que pediam isenção do imposto de renda para portadodres de moléstias graves.
Entretanto, desde 2016 começou a reconhecer que, de um lado, os tribunais superiores (STF e STJ) têm julgado constantemente contra a posição do governo federal neste caso; e de outro, reconheceu também que contestar e apresentar recursos contra sentenças concessivas de isenção estava se tornando perda de tempo e mau uso de recursos públicos. Afinal, se qualquer um pode recorrer das decisões favoráveis à PGFN e ao governo federal com sucesso neste caso, para que insistir?
Por isso, a PGFN começou a revisar sua posição e, com base na Lei 10.522/2002 (art. 19, II; VI “a” e “b”; e §1º), deu início a uma série de discussões internas para autorizar os procuradores, em certas situações, a não contestar, nem recorrer em ações envolvendo isenção de IRPF para pessoas portadoras de moléstia grave.
Há uma série de pareceres, notas e atos declaratórios da PGFN onde fica evidente como essa posição foi se consolidando aos poucos, e sendo ampliadas as situações de dispensa de contestação e recursos ao longo dos anos:
- Nota PGFN/CRJ 863/2015
- Parecer PGFN/CRJ 701/2016
- Ato Declaratório PGFN 5/2016
- Portaria PGFN 502/2016, art. 2º, V e VII
- Nota SEI 48/2018/CRJ/PGFN/PGACET-MF
- Parecer SEI 110/2018/CRJ/PGACET/PGFN-MF
- Parecer SEI nº 19/2018/CRJ/PGACET/PGFN-MF
- Parecer SEI nº 20/2018/CRJ/PGACET/PGFN-MF
- Parecer SEI 212/2025-MF
Com isso, quase todos os pontos mais importantes das ações judiciais de declaração de isenção de IRPF para portadores de moléstias graves estão na lista de dispensa de contestar da PGFN .
Esses documentos mostram que o governo federal reconhece que não há razão jurídica para litigar em casos que se enquadram nos requisitos legais e jurisprudenciais.
Mesmo assim, isso não significa que as ações estejam “protegidas” contra contestações ou recursos; poderá haver outros aspectos não cobertos pela dispensa que justifiquem contestar ou recorrer, que serão explorados pela PGFN no processo sempre que possível.
O que o leitor pode fazer para saber se tem direito
A primeira recomendação para saber se tem direito à isenção de IRPF para aposentados, pensionistas e reformados portadores de doença grave é procurar um advogado. Leve todas as provas para exame, peça ajuda se necessário. A avaliação de um profissional qualificado poderá indicar se você tem direito ou não.
Outra recomendação, antes mesmo de procurar um advogado, é salvar esse artigo e relê-lo algumas vezes. Leia até entender tudo. Ele não dispensa a consulta a um advogado, mas poderá te ajudar a entender se tem ou não direito.
Para consolidar o entendimento do conteúdo desse artigo, é possível responder o questionário a seguir, que permite avaliar se sua situação se enquadra nos requisitos legais:
Esse questionário pode ajudar a entender, de forma prática e rápida, se:
- possui doença listada na lei;
- possui rendimentos de aposentadoria, pensão ou reforma;
- apresenta documentação médica adequada;
- pode ter direito a restituições.
Conclusão
O direito à isenção de IRPF para pessoas com moléstias graves é uma proteção importante garantida pela legislação e pela jurisprudência. No entanto, muitos contribuintes desconhecem esse benefício e continuam arcando com tributos mesmo em situações de grande fragilidade.
A legislação, a jurisprudência e os atos normativos da administração tributária mostram que:
- a isenção é um direito previsto em lei;
- não é necessário laudo médico oficial no pedido feito na Justiça;
- o benefício pode retroagir ao início da doença;
- é possível recuperar valores pagos indevidamente;
- a PGFN reconhece que não deve contestar casos que atendam a certos requisitos.
Diante da complexidade do tema e da necessidade de analisar documentos, datas e histórico clínico, é recomendável que o leitor procure um advogado de confiança, especializado na área, para avaliar com profundidade o seu caso e orientar os próximos passos.