Inventariante em heranças e partilhas: o que é, o que faz, quem pode ser, quanto ganha
12 Oct 2024 · Tempo de leitura: 10 minuto(s)Quem procura por “inventariante” na internet cai nos seguintes resultados:
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Inventariante em logística: profissional responsável por contagem de estoque, cotagem de mercadorias, controle de estoque, realização de inventário de loja, etc. Este artigo não vai tratar deste assunto.
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Inventariante florestal: profissional responsável por colaborar em planos de manejo florestal. Este artigo não vai tratar deste assunto.
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Existem outros perfis de inventariante com responsabilidades parecidas: contagem, elaboração de relatórios, de planos operacionais, de planos de manejo, etc. Este artigo não vai tratar deste assunto.
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Inventariante de heranças: Por fim, existe a figura do inventariante em processos de inventário judicial e em cartório, responsável por administrar heranças enquanto não se faz a partilha; é este o assunto de nosso artigo.
O que é o inventariante, em heranças e partilhas?
Inventariante é a pessoa indicada por juiz (em inventários judiciais) ou escolhida pelos herdeiros (em inventários extrajudiciais) para assumir responsabilidades ligadas à administração dos bens deixados.
A nomeação do inventariante ocorre logo no início do processo de inventário , sendo sua atuação indispensável para que todas as etapas até a partilha dos bens sejam cumpridas adequadamente.
O que faz o inventariante num processo de inventário?
Os art. 618 e 619 do Código de Processo Civil estabelecem as tarefas do cargo de inventariante:
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Representa o espólio (o conjunto dos bens, direitos e obrigações deixados pela pessoa falecida);
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Abre negociações extrajudiciais, processos administrativos ou ações judiciais para reivindicar direitos da pessoa falecida enquanto o inventário estiver aberto e a partilha não for terminada;
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Administra o espólio durante o processo de inventário ;
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Apresenta as primeiras declarações (indicando quem são os herdeiros, os bens a inventariar, o valor dos bens, onde estão, etc.);
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No fim do inventário , apresenta as últimas declarações (versão atualizada das primeiras declarações, incluindo bens descobertos depois das primeiras declarações)
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Presta contas da administração dos bens, seja por vontade própria, seja por requerimento do juiz, seja ao deixar o cargo;
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Junta no inventário a certidão CENSEC;
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Pede a declaração de insolvência (“falência”) da pessoa falecida ou de suas empresas;
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Vende ou aluga bens do inventário (com autorização do juiz e participação dos herdeiros);
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Faz acordos em nome do espólio (com autorização do juiz e participação dos herdeiros);
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Paga as dívidas do espólio (com autorização do juiz e participação dos herdeiros);
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Faz as despesas necessárias para a conservação e o melhoramento dos bens do espólio (com autorização do juiz e participação dos herdeiros).
Lista grande, não?
Pelas responsabilidades que tem, o cargo de inventariante é essencial para a boa condução do inventário .
Essa pessoa deve colaborar com os herdeiros e o(s) advogado(s) contratado(s) para lidar com o inventário , prezando pela solução de pendências deixadas pela pessoa falecida e pela correta destinação dos bens.
Quem pode ser inventariante num processo de inventário?
O art. 617 do Código de Processo Civil estabelece uma ordem de preferência para a nomeação do inventariante:
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Cônjuge ou companheiro sobrevivente (desde que estivesse convivendo com a pessoa falecida quando ela morreu, porque pessoas separadas de fato há mais de dois anos não têm direito à herança);
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Herdeiro que se achar na posse e na administração do espólio, se não houver cônjuge ou companheiro sobrevivente ou se estes não puderem ser nomeados;
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Qualquer herdeiro, quando nenhum deles estiver na posse e na administração do espólio;
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Herdeiro menor, por seu representante legal;
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Testamenteiro, se lhe tiver sido confiada a administração do espólio ou se toda a herança estiver distribuída em legados;
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Cessionário(a) do(a) herdeiro(a) ou do(a) legatário(a);
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Inventariante judicial, se houver;
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Pessoa estranha idônea, quando não houver inventariante judicial.
Qual o melhor perfil para escolher alguém como inventariante?
Para ser inventariante em processos envolvendo heranças, inventários e partilhas, não existe nenhum requisto obrigatório: basta se enquadrar em uma das categorias listadas acima, e é possível ser inventariante.
Entretanto, a prática recomenda que se escolha para inventariante alguém que tenha as habilidades e competências necessárias para desempenhar as funções do cargo:
- Conhecimento básico em administração: O inventariante precisa organizar e gerenciar os bens do espólio, garantindo que as obrigações fiscais e administrativas sejam cumpridas corretamente, o que exige noções de administração e controle financeiro; para isso, é preciso que a pessoa escolhida tenha conhecimento básico em certas técnicas de administração, como saber separar suas contas pessoais das contas do espólio, manter documentos em pastas de fácil acesso, manter registro de cada pequena despesa ou receita do espólio, etc.
- Imparcialidade: inventariante não pode estar "do lado" deste ou daquele herdeiro; pelo contrário, como seu papel é de administrar o espólio em benefício de todos, deve tratar a todos da mesma forma, por igual, sem distinções ou preferências, de acordo com o que as leis mandam, assegurando que todos os envolvidos tenham seus interesses representados de forma justa.
- Comunicação clara: inventariante não pode causar ruídos na comunicação entre herdeiros, nem apresentar informações truncadas que levem o juiz a atrasar o processo com pedidos de explicações; por isso, deve ter capacidade de se comunicar de forma a ser entendido por qualquer pessoa, de forma simples, clara, direta, precisa, compreensível, sem rodeios e sem "palavras difíceis".
- Paciência: os processos de inventário , especialmente quando há divergências entre herdeiros ou bens de difícil liquidação, podem ser longos e envolver diversas etapas burocráticas; o inventariante precisa ser paciente para lidar com as demandas do processo e as expectativas dos herdeiros.
- Capacidade para resolver conflitos: embora não seja obrigação de inventariante lidar com disputas entre herdeiros, sua atuação como pessoa de confiança pode ajudar a esfriar os ânimos, a entender os direitos envolvidos, a mediar e a buscar soluções pacíficas, evitando que disputas atrasem ou comprometam o processo.
Existe o cargo de inventariante dativo? O que faz?
Sim! O cargo de inventariante dativo existe, e pode ser a melhor solução em certos casos.
O inventariante dativo é nomeado pelo juiz quando não há consenso entre os herdeiros sobre quem deve exercer a função de inventariante, ou quando nenhum dos herdeiros ou familiares pode ou deseja assumir o cargo.
Essa figura tem as mesmas responsabilidades e poderes do inventariante tradicional, sendo, portanto, responsável pela administração do espólio e pelo cumprimento de todas as obrigações legais do inventário .
O inventariante dativo, por ser uma pessoa neutra, atua de forma imparcial, zelando pelos interesses do espólio até que a partilha seja finalizada.
Ao final do inventário , como se trata de alguém que não ganha nada com o inventário porque não é herdeiro, o juiz pode estabelecer para o inventariante dativo uma espécie de remuneração, semelhante à do testamenteiro: entre 1% a 5% do valor da herança.
Para receber esta remuneração, o inventariante dativo precisa demonstrar que desempenhou suas funções de maneira diligente e eficiente para fazer jus a essa remuneração, e a sua concessão pode ser solicitada ao final do processo de inventário .
Se o inventariante dativo ganha, quanto ganha um inventariante “normal” num processo de inventário?
Nada. Vamos repetir, em maiúsculas e negrito: NADA.
Se o inventariante também é herdeiro, ou é cônjuge/companheiro(a) da pessoa falecida, não ganhará nada.
Por quê?
Simples:
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Não existe nenhuma previsão legal de pagamento de qualquer remuneração, prêmio, bônus, porcentagem da herança, nada, literalmente nada, a um herdeiro que assume o papel de inventariante.
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Quando o inventariante é um dos herdeiros, já é certo que vai ganhar os bens que sobrarem depois de o espólio cumprir com as obrigações pendentes da pessoa falecida; ao assumir a inventariança, está simplesmente cuidando daquilo que vai receber em breve.
O inventariante “normal” exerce o direito de saisine sobre os bens da herança; em resumo, ele tem a posse e pode vir a ter a propriedade, desde que faça o inventário andar bem.
Por sua vez, o inventariante dativo trabalha para os herdeiros. Quando termina o inventário , não recebe nada, porque não tem direito a nenhum dos bens do inventário . Como trabalha para os herdeiros, nada mais justo que receber remuneração pelo trabalho realizado.
O inventariante pode contratar profissionais para auxiliar na gestão do espólio?
Sim! O inventariante pode, sim, contratar profissionais para auxiliar na gestão do espólio
A responsabilidade do inventariante é ampla. Não é razoável exigir que tenha todo o conhecimento técnico necessário para lidar com questões específicas, como avaliação de ativos, administração de bens, tributação e possíveis disputas entre herdeiros.
Embora a contratação de profissionais auxiliares não seja uma obrigação legal, não somente o inventariante pode contratar profissionais auxiliares em certas situações, como é muito recomendado que o faça.
Da obrigação do inventariante de administrar os bens do espólio não decorre que ele tenha de administrá-los sozinho, por conta própria. Afinal, ninguém nasce sabendo tudo. Ninguém é competente em tudo, nem é razoável que tente sê-lo. Reconhecer a necessidade de contratação de profissionais auxiliares, inclusive, é prova de maturidade pessoal, de competência administrativa, e de boa gestão do espólio.
Por isso, a contratação de profissionais auxiliares é um investimento muito recomendado, se houver condições de bancar sua contratação.
Esta contratação pode ser para atividades pontuais, ou para uma assessoria recorrente, ou mesmo para prestação contínua de serviços.
Eis alguns casos onde se recomenda a contratação de especialistas auxiliares:
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Inventários de maior vulto econômico, exigindo profissionais especializados (administradores, contadores, etc.) para auxiliar na administração dos bens;
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Inventários envolvendo bens complexos (participações em múltiplas empresas);
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Inventários com necessidade de trabalho investigativo (localização de bens “escondidos” por herdeiros,
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Inventários com bens, direitos ou obrigações juridicamente irregulares (imóveis sem documentos, contratos e acordos verbais, doações verbais, etc.);
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Inventários com bens, direitos ou obrigações de difícil liquidação (bens subrogados sem identificação adequada, empresas com difícil liquidação, etc.);
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Inventários que exijam a participação de negociadores profissionais (famílias em conflito, múltiplos credores, etc.);
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Inventários que exijam perícias (atribuição de valor correto a imóveis, perícia contábil para identificar bens subrogados, demarcação de limites de imóveis, etc.);
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Enfim, Inventários que, por qualquer razão, exijam outros saberes técnicos especializados além daqueles do advogado.
Além disso, a atuação desses profissionais contribui para maior transparência no processo, facilitando a prestação de contas e o relacionamento com o juiz responsável.
A contratação de contadores, administradores financeiros, imobiliárias, avaliadores de bens, detetives (em casos de busca de bens, herdeiros ou legatários desaparecidos, investigação de paternidade, etc.), consultores fiscais e tributários, administradores de empresas, etc., pode assegurar que cada aspecto do inventário seja tratado com o devido cuidado.
Esses profissionais podem avaliar e administrar corretamente os bens do espólio, calcular tributos devidos, organizar documentação necessária e lidar com questões operacionais que demandam expertise.
Portanto, em casos de inventários de maior porte, a contratação de especialistas pode não apenas poupar tempo e evitar erros, como também garantir que o patrimônio seja adequadamente preservado até a sua partilha final.
Conclusão
Em resumo, o inventariante exerce um papel fundamental nos processos de inventário , sendo o responsável pela gestão dos bens e pela condução das etapas necessárias para a partilha dos mesmos.
Suas funções abrangem desde a representação do espólio em juízo até a prestação de contas detalhada aos herdeiros e ao juiz.
A escolha do inventariante pode recair sobre diferentes perfis, desde herdeiros até terceiros, dependendo das circunstâncias, sempre com o compromisso de atuar de forma transparente e imparcial.
Embora não exista remuneração pelo exercício da inventariança (salvo no caso do inventariante dativo), a responsabilidade envolvida nesse cargo exige dedicação e uma série de competências, como organização, paciência e habilidades de mediação.
Nos casos em que os herdeiros não chegam a um acordo, a figura do inventariante dativo se torna uma alternativa judicial para garantir a conclusão do processo.
Em qualquer situação, contar com o apoio de um advogado especializado é indispensável para garantir que todas as obrigações legais sejam cumpridas e o inventário transcorra de forma eficiente e justa.