Propriedade e posse: quais as semelhanças? Quais as diferenças?
31 Jul 2024 · Tempo de leitura: 5 minuto(s)Os conceitos de propriedade e posse são fundamentais no Direito, mas muitas vezes confundidos. A confusão é comum, inclusive entre advogados.
Embora relacionados, eles possuem distinções importantes que afetam os direitos e deveres de indivíduos em relação aos bens.
Vamos explorar essas diferenças e semelhanças.
Definição por lei
Propriedade é o direito de usar, gozar e dispor de uma coisa, e de reavê-la de quem injustamente a detenha.
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Usar: Colocar a coisa a seu serviço, desde que não cause dano a outras pessoas nem viole a lei. Exemplos: dirigir um carro; morar numa casa; plantar numa roça; vestir uma roupa; ligar um aparelho na tomada para usar tanto o aparelho quanto a energia elétrica; beber a água do filtro; etc.
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Gozar: Aproveitar qualquer vantagem ou benefício causado pela coisa, desde que não cause dano a outras pessoas nem viole a lei. Exemplos: receber o aluguel de uma casa; colher as mangas num pé de manga; receber juros de aplicações financeiras (poupança, Tesouro Direto, FGTS, etc.); etc.
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Dispor: Possibilidade de transferir a coisa de seu patrimônio, de forma provisória ou permanente, desde que não cause dano a outras pessoas nem viole a lei. Exemplos: vender a casa; dar a roça como garantia de crédito rural; penhorar uma joia; trocar a picape por um terreno; dar uma sacola de pão a uma pessoa em situação de rua; deixar um livro de literatura num banco de praça, para alguém pegar e ler; entregar latas de alumínio a um ponto de reciclagem; etc.
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Reaver: Direito de pedir a coisa de volta de quem esteja com ela, desde que não cause dano a outras pessoas nem viole a lei. Exemplos: pedir de volta uma ferramenta emprestada; pedir à polícia que procure um carro roubado; cobrar o dinheiro que emprestou a um parente; ir à Justiça contra um vizinho que avançou a cerca sobre um pedaço de sua roça; etc.
Posse é o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade.
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Poderes inerentes à propriedade: Usar, gozar, dispor e reaver de quem injustamente a detenha, conforme explicados acima.
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Exercício: Estes poderes estão sendo exercidos, ou foram exercidos em algum momento do passado, ou que se tem direito a exercê-los no futuro.
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Pleno ou não: Quem tem a posse dificilmente tem todos os poderes da propriedade. Na maioria dos casos, pode só usar; em casos menos comuns, pode usar e reaver; em casos raros, pode usar, reaver e gozar; em casos raríssimos, muito difíceis de acontecer, pode usar, reaver, gozar e dispor. Este último caso é o de quem já tem direito à usucapião da coisa.
Exemplos práticos
Como a abstração conceitual pode ser um tanto árida, apresentamos a seguir alguns exemplos concretos para ajudar no entendimento.
1. Livro de receitas de família
Midiã tem um livro de receitas de família, do tempo de sua bisavó. Este livro é uma preciosidade, e vem passando de geração em geração.
Uma pessoa conhecida de Midiã pediu esse livro emprestado para copiar uma receita; Midiã concordou, e emprestou o livro.
Enquanto o livro estiver com essa pessoa, ela tem a posse do livro, mas a propriedade do livro é de Midiã, nunca deixou de ser de Midiã, nem deixará de ser de Midiã enquanto o livro estiver com essa pessoa.
2. Moto utilizada para buscar remédios
Benedito cuida de uma pessoa idosa da família, cujos remédios só estão disponíveis no posto de saúde.
Os remédios estão acabando. A farmácia do posto de saúde fecha antes das 13h. Já são 12h, mas Benedito não pode sair de casa agora.
Benedito tem uma moto. Junto com Benedito, mora também Ruan, sobrinho dele. Benedito pede a Ruan para pegar a moto, ir até o posto de saúde e pegar o remédio.
Ruan faz exatamente isso: pega os documentos da moto e o capacete, pega a moto, vai até o posto, pega o remédio, dirige a moto de volta, entrega os remédios a Benedito e devolve-lhe a moto, os documentos e o capacete.
Nesse trajeto, Ruan teve a posse da moto, mas a propriedade da moto é de Benedito, nunca deixou se ser de Benedito, enquanto a moto esteve com Ruan.
3. Casa alugada na sede do município
Seu Pacheco mora na roça, mas tem uma casa na sede do município. Usava essa casa nos dias de feira, para ter onde ficar, descansar e se alimentar depois de um dia inteiro de trabalho.
Seu Pacheco cresceu o negócio, e agora vende os produtos de sua roça direto para um programa de alimentação escolar do município. Como não usaria mais a casa, alugou-a Seu Palhares, um vizinho de roça, com contrato e tudo.
Enquanto o contrato de aluguel estiver em vigor, Seu Palhares tem a posse da casa, mas a propriedade da casa é de Seu Pacheco, nunca deixou de ser de Seu Pacheco, nem deixará de ser de Seu Pacheco enquanto a casa estiver alugada a Seu Palhares.
Semelhanças entre posse e propriedade
Apesar das diferenças, posse e propriedade compartilham algumas semelhanças importantes:
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Ambas envolvem o uso de um bem: Tanto o possuidor quanto o proprietário podem utilizar o bem para suas necessidades e interesses.
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Proteção legal: Ambos os conceitos são protegidos por lei, garantindo que os direitos do possuidor e do proprietário sejam respeitados.
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Potencial para regularização: A posse, em certos casos, pode evoluir para a propriedade por meio de institutos como a usucapião .
Conclusão
Compreender as diferenças e semelhanças entre posse e propriedade é essencial para quem deseja exercer seus direitos sobre um bem de maneira adequada e legal.
Enquanto a propriedade confere um conjunto completo de direitos, a posse pode ser limitada, mas ainda assim significativa e protegida legalmente.
Conhecer esses conceitos pode ajudar a evitar conflitos e a garantir que os direitos de todas as partes sejam respeitados.