Sharenting: os pais que compartilham demais, e o futuro de seus filhos

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Rede social não é album de família! O compartilhamento excessivo de imagens de crianças pelos pais ou parentes adultos, conhecido como sharenting, pode ter consequências graves sobre o futuro de crianças e adolescentes. Leia o artigo para entender como compartilhar imagens sem prejudicar a privacidade de quem ainda nem tem como se defender direito.

Sharenting: os pais que compartilham demais, e o futuro de seus filhos

Quem vê hoje câmeras embutidas nos celulares sendo usadas para fotografar toda e qualquer coisa, não tem ideia do quanto se avançou nessa tecnologia.

Até o começo dos anos 2000, tirar fotos era uma dificuldade! Máquinas fotográficas eram caras. Ainda eram comuns as máquinas analógicas, de filme: depois de fotografar, era preciso pagar pela revelação. Foto, só em aniversário, batizado, casamento, quinze anos, São João, Natal, ano novo ou formatura.

O álbum de família, até então, era quase uma instituição. Mesmo quando nossos pais não tinham dinheiro para uma câmera, chamavam um fotógrafo para registrar fatos importantes, pelo menos uma vez, para que tivessem lembrança daquele momento.

O problema acontece quando essas fotos e vídeos vão parar na internet, fato muito comum em nossos tempos de celulares com câmera.

Partimos daqui para explicar o que é sharenting, tema deste artigo.

Sharenting: o que é, como funciona

Tem coisa mais fofa que nossas crianças fazendo arte? Lambuzadas de tinta, subindo em árvore, brincando na praça… E aquela fantasia do último aniversário, não ficou linda? Dá uma vontade de tirar foto, gravar vídeo…

Até aí, tudo bem. O problema acontece quando essas fotos e vídeos vão parar na internet.

Há pessoas que ainda não entendem, mas quando pais, mães, avós, tios, tias resolvem compartilhar essas fotos pelo Whatsapp ou por qualquer outro aplicativo de mensagem sem colocar temporizadores, ela já saiu de seu controle, e pode, potencialmente, ir parar em qualquer canto da internet.

Pior ainda quando resolvem colocar essas fotos no Instagram, no Facebook, no Twitter ou em qualquer outra rede social. Apesar de ser possível configurar o acesso às fotos e vídeos, não é impossível contorná-los. E uma vez na internet, dificilmente a foto ou vídeo sairá de circulação.

Mais grave ainda é a situação quando este compartilhamento de imagens na internet é muito frequente. Neste caso, a própria quantidade de fotos e vídeos disponibilizados dificulta o controle sobre sua circulação e armazenamento adequados.

Tudo isso, com diferentes graus de gravidade, é sharenting.

Sharenting é a prática de compartilhar conteúdo relacionado à criação dos filhos nas redes sociais. Isso inclui fotos, vídeos, histórias e atualizações sobre o desenvolvimento dos filhos. A palavra, de invenção recente, vem do inglês; foi formada pela junção de share (“compartilhar”) com parenting (“paternagem” ou “maternagem”, “cuidado com os filhos”). Sharenting, portanto, é a “paternagem que compartilha”. Ainda não há palavra na língua portuguesa, existente ou inventada, com o mesmo significado.

De certa forma, o sharenting pode ser comparado com a antiga prática de montar álbuns de família, pois ambos envolvem documentação e compartilhamento de momentos e acontecimentos da vida familiar. No entanto, existem algumas diferenças significativas entre as duas práticas.

A principal diferença é a forma como o conteúdo é compartilhado. Os álbuns de família eram geralmente compartilhados apenas com membros da família e amigos próximos, enquanto o sharenting envolve o compartilhamento de informações, imagens e vídeos de crianças e adolescentes nas redes sociais e em aplicativos de mensagens instantâneas, podendo então ser vistas, compartilhadas ou mesmo armazenadas sem consentimento por um público muito maior, incluindo estranhos. Isso pode levar a preocupações com a privacidade e a exposição excessiva das crianças nas redes sociais.

Outra diferença é a facilidade de compartilhar conteúdo. Com as redes sociais e aplicativos de mensagens instantâneas, é possível compartilhar conteúdo instantaneamente com pessoas de todo o mundo, enquanto os álbuns de família eram geralmente compartilhados de forma mais seletiva e em momentos específicos, como visitas de parentes ou reuniões familiares. Isso pode levar a um excesso de compartilhamento e sobrecarga de informações nas redes sociais.

Além disso, os álbuns de família geralmente eram guardados como recordações para ser apreciadas no futuro, enquanto o conteúdo compartilhado no sharenting pode ser rapidamente esquecido e perdido na avalanche de conteúdo nas redes sociais.

Outra diferença é que, apesar as crianças e adolescentes não terem controle sobre o que era compartilhado ou como era compartilhado nos álbuns de família, geralmente eram seus pais ou responsáveis legais quem criava e mantinha essas coleções de imagens. Com o sharenting, entretanto, há o risco de compartilhamento de fotos ou vídeos de crianças e adolescentes sem o consentimento prévio da criança ou adolescente, ou de seus pais e responsáveis, o que pode violar sua privacidade e expô-los a riscos de segurança.

Sharenting, privacidade e direitos da criança e do adolescente

Enquanto alguns pais e responsáveis acreditam que o sharenting é uma forma de documentar e compartilhar as realizações de seus filhos, deve-se tomar cuidado com os riscos da exposição excessiva na internet e as implicações legais. A relação entre sharenting e as leis brasileiras de proteção de dados (Lei Geral de Proteção de Dados – LGPD) e de proteção de crianças e adolescentes (Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA) é complexa e merece atenção.

Contrariando a noção equivocada de que “se está na internet é público”, não é porque uma foto ou vídeo está na internet que se deve usá-la de modo ilegal. A LGPD estabelece regras para o tratamento de dados pessoais no Brasil, incluindo a proteção de crianças e adolescentes. O artigo 14, § 1º, da LGPD afirma que a coleta de dados pessoais de crianças e adolescentes deve ser feita com o consentimento dos pais ou responsáveis legais. Além disso, informações coletadas devem ser adequadas, relevantes e não excessivas em relação à finalidade para a qual são destinadas.

Por outro lado, o ECA estabelece medidas de proteção para crianças e adolescentes no Brasil, proibindo a família, a comunidade e a sociedade em geral de expor crianças e adolescentes a situações que possam prejudicar sua dignidade, saúde e desenvolvimento mental, moral e social.

A exposição excessiva de crianças e adolescentes nas redes sociais através do sharenting pode violar tanto a LGPD quanto o ECA. A exposição de imagens e informações sem o consentimento prévio dos pais ou responsáveis legais

Por fim, é importante lembrar que o sharenting é uma prática recente, e ainda não sabemos como isso afetará as crianças e a família no futuro. Eis porque é melhor prevenir riscos futuros que lidar com adultos impactados negativamente pelo sharenting.

Como compartilhar imagens e vídeos com segurança e privacidade

Pode-se comparar o sharenting com a antiga prática de montar álbuns de família em termos de documentação e compartilhamento de momentos importantes da vida familiar, mas há importantes diferenças na forma como o conteúdo é compartilhado, facilidade de compartilhamento, privacidade e impacto no futuro. É importante que os pais pensem cuidadosamente sobre as implicações do sharenting antes de compartilhar conteúdo relacionado às suas crianças nas redes sociais e em aplicativos de mensagens instantâneas.

Mas então é impossível compartilhar fotos e vídeos de crianças e adolescentes na internet sem que isso represente violação de privacidade? De acordo com a legislação brasileira, isso é possível, sim, desde que sejam tomadas medidas para proteger a privacidade das crianças e adolescentes e sejam respeitadas as normas da LGPD e do ECA.

Uma forma de fazê-lo seria obtendo o consentimento prévio dos pais ou responsáveis legais antes de compartilhar qualquer informação ou imagem das crianças e adolescentes. Além disso, é importante evitar compartilhar informações sensíveis, como endereços ou telefones de contato, e garantir que as imagens não exponham as crianças e adolescentes a situações que possam prejudicar sua dignidade, saúde, segurança e desenvolvimento moral e intelectual.

Outra medida importante seria usar as configurações de privacidade das redes sociais para limitar o acesso às informações compartilhadas, e evitar compartilhar fotos ou vídeos que possam expor a criança ou adolescente a riscos de segurança ou de serem vítimas de cyberbullying.

Em resumo, é possível compartilhar fotos e vídeos de crianças e adolescentes na internet sem violar sua privacidade, mas é importante tomar medidas para proteger a privacidade das crianças e adolescentes e seguir as normas da LGPD e do ECA, obtendo o consentimento prévio, evitando compartilhar informações sensíveis, usando configurações de privacidade e evitando expor as crianças e adolescentes a situações que possam prejudicar sua dignidade, saúde, segurança e desenvolvimento moral e intelectual.