Posso usar filmes antigos em meu vídeo sem pagar direitos autorais?
20 Jul 2021 · Tempo de leitura: 4 minuto(s)Recebi esses dias uma pergunta “puxada”:
A quem pedir autorização para imagens do Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP) do governo Getúlio Vargas para serem utilizadas em uma série em formato documentário a ser exibida em canal público?
A pergunta parece “puxada” porque o Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP) foi extinto em 1945 e suas atribuições foram assumidas pelo Departamento Nacional de Informações (DNI), ele próprio extinto em 1946. (Clique aqui para ler o artigo da Wikipédia sobre o DIP – mas lembre de voltar para cá depois!) O DIP era subordinado diretamente à Presidência da República, o DNI ao Ministério da Justiça. Com a extinção de ambos, restou como sobrevivente a Agência Nacional, depois transformada em Empresa Brasileira de Notícias (1979), que em 1988 teve incorporada a si a Empresa Brasileira de Comunicação – Radiobrás e, em 1992, foi transformada na atual Agência Brasil, controlada desde 2003 pela Empresa Brasil de Comunicação (EBC).
Neste vaivém de sucessores, a titularidade dos direitos autorais dos filmes e documentários produzidos por encomenda para o DIP parece difícil de rastrear.
Há uma esperança, entretanto, para quem queira aproveitar esse enorme acervo documental para produzir obras derivadas: estes filmes documentários poderiam já ter caído em domínio público?
A lei de direitos autorais (Lei 9.610, de 1998) ajuda a elucidar a questão:
Art. 44. O prazo de proteção aos direitos patrimoniais sobre obras audiovisuais e fotográficas será de setenta anos, a contar de 1° de janeiro do ano subseqüente ao de sua divulgação.
Por este critério, considerando que este artigo foi fechado em julho de 2021, toda obra audiovisual e fotográfica produzida no Brasil antes de 1º de janeiro de 1952 encontra-se em domínio público.
O “cálculo” é simples. Digamos que um filme produzido no Brasil tenha sido exibido pela primeira vez há setenta anos. Novamente tendo julho de 2021 como referência, recuar setenta anos no tempo significa voltar a julho de 1951. O “1° de janeiro do ano subseqüente ao de sua divulgação” é o 1º de janeiro de 1952.
Portanto, ainda outra vez tomando julho de 2021 como referência, qualquer obra fotográfica ou audiovisual publicada pela primeira vez até 31 de dezembro de 1951 já caiu em domínio público.
No que diz respeito a eventual pagamento de licenças ou qualquer forma de exercício de direito autoral patrimonial, nem é necessário procurar titulares de direitos autorais. Os documentários do DIP, produzidos entre 1939 e 1945, estão todos em domínio público, portanto.
Por outro lado, os direitos morais de reivindicação de autoria, de indicação de autoria e de preservação da integridade da obra podem passar para sucessores. A probabilidade de que isso aconteça é muito baixa, mas não deixa de existir.
Para isso, há uma solução: um aviso legal (disclaimer).
Não vamos entrar em muitos detalhes sobre avisos legais porque escrevemos um bom artigo sobre o assunto, cuja leitura recomendamos.
No caso da pergunta que dá título a este artigo, o aviso legal pode ser algo bem simples, como esse:
Fizemos todos os esforços para contatar os titulares dos direitos autorais das obras originais empregues na produção deste vídeo, nem sempre com sucesso. Se você tiver meios para comprovar sua titularidade e tiver questões de direito autoral relativas a este vídeo, entre em contato com a [COLOQUE AQUI O NOME DA PRODUTORA] para dialogarmos.
Este aviso legal pressupõe que será fornecido algum contato da produtora (site, endereço, e-mail, telefone, perfil em redes sociais etc.), para que eventuais titulares de direito autoral possam procurá-la para resolver eventuais questões. O melhor lugar para colocá-lo? Este aviso cai bem como um dos últimos itens dos créditos.
Mas atenção: antes de sair usando este artigo como justificativa para usar todo e qualquer filme anterior a 1º de janeiro de 1952 em sua produção audiovisual, lembre-se que o melhor, sempre, é fazer uma análise cuidadosa do material a ser usado. Há algumas exceções a esta regra geral, sobre as quais poderei falar em outro momento.