Recebendo muitas ligações de cobrança? Veja o que fazer (2) se você não tem dívida em aberto

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Apesar de as empresas terem o direito de fazer cobranças a devedores, elas não podem abusar, constranger, tirar o sossego. Mesmo assim, é comum usarem serviços de cobrança telefônica de modo abusivo, ligando a qualquer hora, várias vezes ao dia, sem parar. Até quem não tem dívida alguma está sujeito a receber ligações abusivas e indesejadas a qualquer hora, cobrando dívidas que nunca teve. O que fazer para recuperar o sossego perdido? Este artigo apresenta uma estratégia possível para resolver a situação por meio judicial. Se tem dúvidas, entre em contato para agendarmos um atendimento.

O chamado “telemarketing outbound”, ou “telemarketing ativo”, pode ser uma atividade legítima. Para isso, de acordo com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), o consentimento “livre, informado e inequívoco” (LGPD, art. 5º, XII e art. 7º, I) é a base para que a empresa faça as ligações sem praticar abusos. Este consentimento, entretanto, não pode ser um consentimento geral, uma autorização genérica que valha para tudo (LGPD, art. 8º, § 4º); segundo a LGPD, você tem de ter dado autorização específica e bem determinada para este tipo de contato.

Quem está do outro lado te ligando, assim como você, é o lado mais fraco da corda. É uma pessoa que trabalha oito, dez horas por dia, às vezes sem direito de ir sequer ao sanitário, para fazer cobranças que não a agradam. É uma oportunidade de trabalho que poderia ser legítima, não fosse a má orientação dos gerentes, supervisores e donos das empresas de telemarketing, que não investem em atualização de sistemas e sujeitam os trabalhadores do ramo a cometer todo tipo de abuso para bater metas inalcançáveis.

Não é deste telemarketing legítimo que quero falar, porque ele, além de ser muito raro, não é o problema que aflige milhares de pessoas nos dias de hoje. O caso, aqui, é outro. É o de gente que recebe dez, vinte, quarenta ligações por dia, da mesma empresa. É o de gente que recebe ligações de noite, ou de madrugada, em horários inconvenientes. É o das ligações abusivas. Esta “praga” afeta inclusive quem não tem dívidas, mas que por “mistérios” inexplicáveis termina sendo vítima dos abusos de empresas de cobrança.

Não adianta querer que o atendente resolva tudo, porque ele é treinado para saber o que fazer até com os clientes mais agressivos ou intimidadores. Além disso, como essas ligações costumam ser gravadas, você pode terminar perdendo a razão.

O que fazer, então?

Há quem leve o caso à justiça sem muita preparação de provas. Eu mesmo já dei entrada em processos assim, com simples alegação de desconhecimento da dívida e certidões negativas do SERASA; como a empresa não provou existência de vínculo jurídico entre ela e minha cliente, foi possível conseguir sentença declarando inexistência de débito, mas não os danos morais pedidos – quando minha cliente chegou a receber dezoito ligações no mesmo dia, sem contar as mensagens via SMS, todas cobrando uma dívida que ela nunca teve.

Assim como no caso de quem tem dívidas, mas tem recebido cobrança abusiva por meio de ligações telefônicas, quem tem o nome limpo precisa ter estratégia e paciência. Vamos usar a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e o Código de Defesa do Consumidor como base para uma tática mais assertiva, que pode fundamentar tanto os pedidos de cessação das ligações e de declaração de inexistência de débito, quanto uma indenização por danos morais.

Uma estratégia assertiva, baseada em direitos

A primeira coisa a fazer é ter um “caderninho de ligações”. Sim, parece ridículo, mas manter um registro de quantas ligações foram feitas, a que dia, a que horas, e em nome de que empresa, servirá para provar a abusividade da cobrança.

Tendo já o “caderninho de ligações”, atenda todas elas. Sim, atenda todas, atenda cada uma delas. Com isso, cada ligação que ficar no registro de seu telefone ficará com um tempo maior que alguns segundos, e isso servirá depois como prova de que o contato foi feito, de que houve diálogo com o atendente. Registre cada ligação no “caderninho”. Ao atender, tome o cuidado de anotar o nome do atendente, e de nunca aceitar qualquer acordo, ao menos num primeiro momento. Peça o número de protocolo da ligação, e anote-o no “caderninho”. Faça isso por um mês, pelo menos.

Tomadas estas providências, você precisará, agora, de ter uma postura assertiva. Vocẽ precisa exercer seu direito de informação sobre seus dados pessoais que estão em posse da empresa que está te ligando.

Caso você ainda não saiba, você tem direito, pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC, art. 43), a ter “acesso às informações existentes em cadastros, fichas, registros e dados pessoais e de consumo arquivados” sobre você, e também a saber sobre as fontes destas informações, ou seja, sobre como estes dados chegaram até o atendente. Estes bancos de dados e cadastros são considerados de caráter público (CDC, art. 43, § 4º).

Se, além desses direitos já garantidos pelo Código de Defesa do Consumidor, usarmos também os direitos garantidos pela Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), a situação fica ainda mais favorável para você. A LGPD garante seus direitos à privacidade e à autodeterminação informativa (LGPD, art. 2º, I e II). Além disso, ela exige seu consentimento prévio como regra para o tratamento ou o compartilhamento de seus dados pessoais (LGPD, art. 7º, I e art. 7º, § 5º). Permite, também, revogar o consentimento dado para o tratamento de seus dados pessoais “a qualquer momento mediante manifestação expressa do titular” (LGPD, art. 8º, § 5º). Garante, ainda, direito “ao acesso facilitado às informações sobre o tratamento de seus dados, que deverão ser disponibilizadas de forma clara, adequada e ostensiva” (LGPD, art. 9º) sobre vários temas importantes para a atividade de telemarketing e cobranças telefônicas, como finalidade, forma e duração do tratamento de dados (LGPD, art. 9º, I e II), identificação e informações de contato do controlador de dados (LGPD, art. 9º, III e IV).

Difícil? É sim, um pouco. Leia novamente esta parte, e se puder leia também a LGPD (Lei 13.709/2018). Ela é autoexplicativa. Para os fins da estratégia que estamos construindo, basta saber que “dados”, aqui, são todas as suas informações pessoais (número de telefone, CPF, RG, endereço etc.), e que o “controlador” desses dados são as empresas de cobrança e telemarketing.

Agora sim, mãos à obra

Tendo já o “caderninho de ligações” em mãos, você precisará escolher uma das ligações para fazer um tratamento mais assertivo da questão. Faça isso de preferência quando tiver tempo, porque a ligação vai demorar. A partir daqui, você deve ligar o celular no viva-voz e ter alguém gravando toda a conversa em vídeo.

Ao atender a ligação, depois que o atendente disser a finalidade da ligação, seu nome e qualquer outro dado pessoal seu, interrompa-o com a seguinte pergunta: “como você teve acesso a meus dados pessoais?” Já vimos que você tem direito a esta informação (Código de Defesa do Consumidor, art. 43; LGPD, art. 9º ); cite essas leis e os artigos, se necessário. O atendente é treinado pela empresa para desconversar, para falar coisas vagas. Insista. Pergunte de novo. Obtenha alguma resposta mais concreta, mais plausível. Obtenha nomes. Alguém passou suas informações para quem está te ligando, e você precisa saber quem é. Se o atendente não fornecer, se enrolar demais, pergunte diretamente: “então você está se recusando a me dizer como estes dados pessoais meus chegaram até você?” Qualquer resposta evasiva pode ser interpretada como uma recusa a responder, então deixe o atendente enrolar bastante. Insista na pergunta, se necessário.

Tendo conseguido ou não a informação sobre quem passou suas informações pessoais para quem está te ligando, o segundo passo é saber quem é o “controlador” desses dados. O “controlador”, como vimos, é a empresa que contratou o atendente. Pergunte desta forma: “se vocês têm dados pessoais meus, quem é o controlador desses dados? Quem é o encarregado de proteção de dados da empresa?” Mais uma vez, você tem direito a esta informação (LGPD, art. 9º, III e IV); cite essa lei e os artigos, se necessário. Você deve pedir o nome completo da empresa, o CNPJ e o endereço. Peça também o nome do encarregado de proteção de dados da empresa, e os contatos dele. Insista nessa pergunta, até que você consiga um nome, ou que o atendente desconverse tanto que fique claro que ele está se recusando a te fornecer a informação a que você tem direito; neste último caso, arremate com a pergunta: “então vocês estão se recusando a me informar quem é o controlador desses dados, e quem é o encarregado de dados da empresa, correto?” Deixe que o atendente responda, ou que dê respostas vagas que demonstrem que ele não tem interesse em responder.

O terceiro passo é saber que informações a empresa tem sobre você. Faça uma pergunta explícita: “além de meu nome e telefone, que outras informações sobre mim vocês têm no seu banco de dados?” Como sempre, você tem direito a esta informação (Código de Defesa do Consumidor, art. 43; LGPD, art. 9º, I e II); cite essas leis e os artigos, se necessário. Insista. O atendente é treinado a não responder, a dar respostas vagas, a enrolar. Insista, insista o quanto for necessário, até que ele dê as informações, ou que enrole tanto que fique evidente que ele não quer responder; neste último caso, pergunte explicitamente: “então você está se recusando a me informar sobre que dados pessoais meus vocês têm no seu banco de dados, correto?” Mesmo caso das perguntas anteriores: ou o atendente responde diretamente, ou dará respostas vagas e evasivas.

O quarto passo é o mais drástico, e servirá para encerrar a ligação: você vai revogar qualquer consentimento ao tratamento de seus dados pessoais pela empresa. Use exatamente esta frase: “não tenho interesse em ter meus dados pessoais tratados por vocês, então meu consentimento está revogado desde agora. Solicito que vocês encerrem qualquer tratamento de dados pessoais meus, e que eliminem de seus bancos de dados qualquer informação relacionada a mim”. Tudo isso é direito seu (LGPD, art. 8º, § 5º; art. 15, III; e art. 18, VI e IX); cite essa lei e os artigos, se necessário. Insista. A esta altura, seus nervos já devem estar à flor da pele, mas é o último passo. Insista na pergunta até conseguir que o atendente elimine seus dados pessoais do banco de dados da empresa, se negue a fazê-lo, ou não faça nada além de dar respostas evasivas. Se seus dados pessoais não houverem sido eliminados, você encerrará a ligação assim: “como vocês não estão respeitando meus direitos à autodeterminação informativa, à revogação do consentimento para o tratamento de dados e à eliminação dos meus dados de seus bancos de dados, nossa conversa se encerra aqui, porque vou buscar meus direitos na justiça”. Encerre a ligação, e termine a gravação.

O passo seguinte

Depois de passar por este longo teste de paciência, salve o vídeo numa mídia – lembre-se, você começou a ligação gravando tudo em vídeo! – e leve-o a um cartório de notas. Vocẽ vai apresentar o vídeo a um funcionário do cartório, e pedirá que ele transcreva o conteúdo do vídeo, as falas todas, sem exceção, e produza uma ata notarial. Apresente também o registro de ligações de seu celular, pedindo ao funcionário que produza outra ata notarial transcrevendo os números de telefone, as datas, os horários e a duração das ligações telefônicas de cobrança indevida. Esta última ata notarial precisa declarar, também, o número da linha do aparelho que recebeu estas ligações, para provar que estas ligações foram recebidas pela sua linha telefônica, não por outra.

Agora você já tem o “caderninho de ligações”, as duas atas notariais e o vídeo, leve tudo a um advogado. Se você conseguir alguém que testemunhe em seu favor quanto às ligações abusivas, leve também ao advogado nome completo, endereço com CEP, documento de identidade e CPF das testemunhas. Vocẽ pedirá ao advogado para ajuizar uma ação solicitando que seja declarado inexistente qualquer relação entre você e a empresa; que a empresa responsável pelos telefonemas abusivos pare de te ligar, elimine de seus bancos de dados toda informação a seu respeito e abstenha-se de compartilhá-las com quem quer que seja; e pedirá também uma indenização por danos morais.

Não é trabalho demais para pouco resultado?

Parece excessivo. Muito esforço para pouco resultado. Em artigo anterior com tema parecido, apresentei julgados de vários tribunais a demonstrar o que acontece quando não há prova suficiente da abusividade das ligações; convido à leitura dele, e também a ver, a seguir, como têm decidido vários tribunais do país sobre este mesmo assunto, quando há provas suficientes de que você não tem relação alguma com a empresa que está te cobrando:

RECURSO ESPECIAL. CONSUMIDOR. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO OCORRÊNCIA. CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO. CLÁUSULAS ABUSIVAS. COMPARTILHAMENTO DE DADOS PESSOAIS. NECESSIDADE DE OPÇÃO POR SUA NEGATIVA. DESRESPEITO AOS PRINCÍPIOS DA TRANSPARÊNCIA E CONFIANÇA. ABRANGÊNCIA DA SENTENÇA. ASTREINTES. RAZOABILIDADE. 1. É facultado ao Juízo proferir sua decisão, desde que não haja necessidade de produzir provas em audiência, assim como, nos termos do que preceitua o princípio da livre persuasão racional, avaliar as provas requeridas e rejeitar aquelas que protelariam o andamento do processo, em desrespeito ao princípio da celeridade. 2. A Anadec - Associação Nacional de Defesa do Consumidor, da Vida e dos Direitos Civis tem legitimidade para, em ação civil pública, pleitear o reconhecimento de abusividade de cláusulas insertas em contrato de cartão de crédito. Precedentes. 3. É abusiva e ilegal cláusula prevista em contrato de prestação de serviços de cartão de crédito, que autoriza o banco contratante a compartilhar dados dos consumidores com outras entidades financeiras, assim como com entidades mantenedoras de cadastros positivos e negativos de consumidores, sem que seja dada opção de discordar daquele compartilhamento. 4. A cláusula posta em contrato de serviço de cartão de crédito que impõe a anuência com o compartilhamento de dados pessoais do consumidor é abusiva por deixar de atender a dois princípios importantes da relação de consumo: transparência e confiança. 5. A impossibilidade de contratação do serviço de cartão de crédito, sem a opção de negar o compartilhamento dos dados do consumidor, revela exposição que o torna indiscutivelmente vulnerável, de maneira impossível de ser mensurada e projetada. 6. De fato, a partir da exposição de seus dados financeiros abre-se possibilidade para intromissões diversas na vida do consumidor. Conhecem-se seus hábitos, monitoram-se a maneira de viver e a forma de efetuar despesas. Por isso, a imprescindibilidade da autorização real e espontânea quanto à exposição. 7. Considera-se abusiva a cláusula em destaque também porque a obrigação que ela anuncia se mostra prescindível à execução do serviço contratado, qual seja obtenção de crédito por meio de cartão. 8. Não se estende a abusividade, por óbvio, à inscrição do nome e CPF de eventuais devedores em cadastros negativos de consumidores (SPC, SERASA, dentre outros), por inadimplência, uma vez que dita providência encontra amparo em lei (Lei n. 8.078/1990, arts. 43 e 44). 9. A orientação fixada pela jurisprudência da Corte Especial do STJ, em recurso repetitivo, no que se refere à abrangência da sentença prolatada em ação civil pública, é que “os efeitos e a eficácia da sentença não estão circunscritos a lindes geográficos, mas aos limites objetivos e subjetivos do que foi decidido, levando-se em conta, para tanto, sempre a extensão do dano e a qualidade dos interesses metaindividuais postos em juízo (arts. 468, 472 e 474, CPC e 93 e 103, CDC)” (REsp 1.243.887/PR, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, CORTE ESPECIAL, DJe de 12/12/2011). 10. É pacífico o entendimento no sentido de que a revisão da multa fixada, para o caso de descumprimento de ordem judicial, só será possível, nesta instância excepcional, quando se mostrar irrisória ou exorbitante, o que, a meu ver, se verifica na hipótese, haja vista tratar-se de multa diária no valor de R$10.000,00 (dez mil reais). 11. Recurso especial parcialmente provido. (STJ - REsp: 1348532 SP 2012/0210805-4, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 10/10/2017, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 30/11/2017)

RECURSO INOMINADO. CONSUMIDOR. BANCO. AÇÃO INDENIZATÓRIA. COBRANÇA DE DÍVIDA INDEVIDA POR MEIO DE LIGAÇÕES TELEFÔNICAS EFETUADAS PELA RÉ. EXCESSO DE LIGAÇÕES REALIZADAS COTIDIANAMENTE, EM HORÁRIOS INAPROPRIADOS. PERTURBAÇÃO DO SOSSEGO. COBRANÇA ABUSIVA. PARTE AUTORA EXPOSTA A SITUAÇÃO HUMILHANTE E VEXATÓRIA. SITUAÇÃO QUE ULTRAPASSA O LIMITE DO MERO DISSABOR COTIDIANO. DANO MORAL EXCEPCIONALMENTE CONFIGURADO. QUANTUM INDENIZATÓRIO FIXADO EM R$ 3.000,00, QUE NÃO COMPORTA REDUÇÃO, POIS ARBITRADO EM CONSONÂNCIA COM OS PARÂMETROS UTILIZADOS PELAS TURMAS RECURSAIS CÍVEIS EM CASOS ANÁLOGOS, OBSERVANDO OS CRITÉRIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. SENTENÇA CONFIRMADA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. RECURSO DESPROVIDO. (Recurso Cível Nº 71007213093, Primeira Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Roberto Carvalho Fraga, Julgado em 31/10/2017). (TJ-RS - Recurso Cível: 71007213093 RS, Relator: Roberto Carvalho Fraga, Data de Julgamento: 31/10/2017, Primeira Turma Recursal Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 01/11/2017)

CONSUMIDOR. COBRANÇA DE DÍVIDA PRESCRITA REALIZADA POR ESCRITÓRIO DE ADVOCACIA. LIGAÇÕES TELEFÔNICAS REITERADAS E ENVIOS DE MENSAGENS POR E-MAIL. PRÁTICA COMERCIAL ABUSIVA. DANO MORAL CONFIGURADO. RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA REJEITADA. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. 1. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito e se sujeita ao dever de indenizar. 2. O escritório de advocacia que presta serviço de cobrança/negociação para banco responde pelos danos decorrentes de eventual excesso ou abuso, nos termos do artigo 25, § 1º, do CDC. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA REJEITADA. 3. No caso concreto, o autor, ora recorrido, narra que há mais de 3 anos vem recebendo e-mails e reiteradas ligações telefônicas do réu cobrando uma dívida prescrita. Alega que são inúmeras ligações no seu celular, na sua residência e no seu escritório que começam pela manhã e se estendem até a noite, bem como ocorre nos finais de semana. Afirma que as ligações estão causando aflição e constrangimento, pois acontecem em qualquer período do dia, repetidas vezes. Por fim, esclarece que para tentar resolver o problema procurou o Procon, ReclameAqui e MPDFT, mas não obteve êxito em fazer cessar as cobranças (ID 7432234 página 1 a 33). 4. Em sua peça de defesa o réu sustenta, preliminarmente, a sua ilegitimidade passiva e, no mérito, afirma que não houve comprovação de dano. Todavia, não juntou nenhuma prova que demonstrasse a existência da dívida e a razoabilidade nas cobranças, pelo que não se desincumbiu de seu ônus probatório, nos termos do artigo 373, II, do CPC. Restou incontroverso a alegação da parte autora de que as ligações de cobrança são insistentes em diferentes horários do dia. 5. Lado outro, os prints da tela do celular do autor e os e-mails comprovam que a cobrança é reiterada. Outrossim, a ligação gravada (ID 7432222) demonstra a falta de cordialidade com o consumidor e a intenção de permanecer com as cobranças, mesmo se tratando de dívida prescrita. 6. Vale ressaltar que o réu, como mandatário do banco, tem direito de efetuar cobranças e fazer negociações, até mesmo de dívida prescrita, ao consumidor que esteja inadimplente, mas o exercício abusivo desse direito configura ato ilícito (CC, art. 186) e sujeita o infrator ao dever de indenizar os danos cometidos. 7. A par de tal quadro, restou comprovada que a conduta do recorrente, além de abusiva, perturba a paz do consumidor, sendo certo que a insistência ultrapassa a órbita do mero aborrecimento e consubstancia dano moral indenizável. 8. Quanto ao valor da indenização por dano moral não há um critério matemático ou padronizado para estabelecer o montante pecuniário devido à reparação. O valor da reparação deve guardar correspondência com o gravame sofrido, devendo o juiz pautar-se nos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, sopesando as circunstâncias do fato e as condições pessoais e econômicas das partes envolvidas, assim como o grau da ofensa moral e sua repercussão. 9. Atento às diretrizes acima elencadas, entendo o montante de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), como suficiente para, com razoabilidade e proporcionalidade, compensar os danos sofridos pela parte autora, sem, contudo, implicar em enriquecimento sem causa. 10. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. 11. Sentença mantida por seus próprios e jurídicos fundamentos, com súmula de julgamento servindo de acórdão, na forma do artigo 46 da Lei nº 9.099/95. 12. Diante da sucumbência, nos termos do artigo 55 da Lei dos Juizados Especiais (Lei nº 9.099/95), condeno o recorrente ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 15% (quinze por cento) do valor da condenação. (TJ-DF 07489609620188070016 DF 0748960-96.2018.8.07.0016, Relator: ASIEL HENRIQUE DE SOUSA, Data de Julgamento: 30/04/2019, Terceira Turma Recursal, Data de Publicação: Publicado no DJE : 15/05/2019 . Pág.: Sem Página Cadastrada.)

Consumidor – Cobrança abusiva – Ligações telefônicas para obter o pagamento de dívida inexistente – Imposição de obrigação de não fazer, sob pena de multa, e indenização dos danos morais causados – Cabimento da penalidade – Prejuízo imaterial configurado – Recurso desprovido (TJ-SP - RI: 10125559120168260577 SP 1012555-91.2016.8.26.0577, Relator: Matheus Amstalden Valarini, Data de Julgamento: 26/06/2017, 3º Turma Cível, Data de Publicação: 26/06/2017)

Como se vê, a estratégia que à primeira vista pode parecer excessiva é somente um método para produzir as provas necessárias à comprovação do tratamento de dados pessoais sem consentimento, e também do caráter abusivo da cobrança de uma dívida que você não tem. É um método de produção de provas trabalhoso, mas que qualquer um pode fazer, e ajudará muito a conseguir um resultado positivo no Judiciário.



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